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sexta-feira, 2 de setembro de 2011

ZUMBI DOS PALMARES UMA LUTA QUE NÃO PODE SER ESQUECIDA


QUANDO TUDO ACONTECEU...

c.1600: Negros fugidos ao trabalho escravo nos engenhos de açúcar de Pernambuco, fundam na serra da Barriga o quilombo de Palmares; a população não pára de aumentar, chegarão a ser 30 mil; para os escravos, Palmares é a Terra da Promissão. - 1630: Os holandeses invadem o Nordeste brasileiro. - 1644: Tal como antes falharam os portugueses, os holandeses falham a tentativa de aniquilar o quilombo de Palmares. - 1654: Os portugueses expulsam os holandeses do Nordeste brasileiro. - 1655: Nasce Zumbi, num dos mocambos de Palmares - 1662 (?): Criança ainda, Zumbi é aprisionado por soldados e dado ao padre António Melo; será baptizado com o nome de Francisco, irá ajudar à missa e estudar português e latim. - 1670: Zumbi foge, regressa a Palmares. - 1675: Na luta contra os soldados portugueses comandados pelo Sargento-mor Manuel Lopes, Zumbi revela-se grande guerreiro e organizador militar. - 1678: A Pedro de Almeida, Governador da capitania de Pernambuco, mais interessa a submissão do que a destruição de Palmares; ao chefe Ganga Zumba propõe a paz e a alforria para todos os quilombolas; Ganga Zumba aceita; Zumbi é contra, não admite que uns negros sejam libertos e outros continuem escravos. - 1680: Zumbi impera em Palmares e comanda a resistência contra as tropas portuguesas. - 1694: Apoiados pela artilharia, Domingos Jorge Velho e Vieira de Mello comandam o ataque final contra a Cerca do Macaco, principal mocambo de Palmares; embora ferido, Zumbi consegue fugir. - 1695, 20 de Novembro: Denunciado por um antigo companheiro, Zumbi é localizado, preso e degolado.



CANDOMBLÉ

Armazém de escravos


De Lisboa para o Rio de Janeiro antes que a PIDE me deitasse a mão... Ali faço boa amizade com o Ricardo, homem bem mais velho do que eu, mulato não muito escuro. Economista, tem um bom emprego no Banco do Brasil. Mas nunca é promovido. Os seus colegas brancos, que tinham entrado ao mesmo tempo do que ele, já ganham o dobro do seu salário. Diz-me:

- Portuga: sou branco de menos para chefiar e branco de mais para fazer limpeza. Até entendo a Administração do Banco: preto, se não caga na entrada, com certeza caga na saída...

Ele a dizer-me isto e eu a pensar na Casa Grande e Senzala do Gilberto Freire. Sociologia? Talvez melaço, isso sim! A disposição do português para fornicar todas as mulheres, qual seja a cor que tiverem, isso não é democracia racial, é fúria genital. E parem lá de me salpicar com o luso-tropicalismo para adoçar a pastilha... Palmadinhas nas costas mas fica aí no teu lugar, escraviza muito mais do que murros, palmatórias, chicotes, ou grilhetas. Em 1884 ocorre a Conferência de Berlim para a partilha da África pela potências europeias, fronteiras a régua e esquadro a cortar povos ao meio. Para os diplomatas, "tribos" é igual a "coisas". Ingleses, franceses, belgas e alemães usam realmente os pretos como "coisas". E com "coisas" não há trato, arrumam-se aqui, consomem-se ali, deitam-se fora quando se estragam. Já os portugueses tratam os pretos como homens, porém inferiores, eu aqui em cima, tu aí em baixo, estás a perceber ó escarumba? Palmadinhas nas costas, vai à vida e não te queixes, quem não trabuca não manduca... "Assimilados, portugueses de segunda", é justamente como Salazar chama aos pretos. É mútua a simpatia entre Gilberto e Salazar. Está-se a ver porquê...

Venho de um país em que a Igreja é o grande sustentáculo do fascismo. O que me seduz em Ricardo é o escárnio permanente que ele faz da Bíblia:

- Para o asno forragem, chicote e carga; para o servo pão, castigo e trabalho, diz a Bíblia, ou dizem os seus pregadores. Portuga: a Bíblia tem feição de senhor de escravos... Ó se a gente preta tirada das brenhas da sua Etiópia, e passada ao Brasil, conhecera bem quanto deve a Deus, e à sua Santíssima Mãe por este que pode parecer desterro, cativeiro e desgraça, e não é senão milagre, e grande milagre!, prega um pregador famoso. Portuga: a Bíblia tem palavras de feitor... Há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens, é Jesus Cristo, dizem outros; exorcizam os orixás como espíritos do Inferno e tratam de excomungar os seus fiéis e seguidores. Portuga: a Bíblia tem maneiras de inquisidor... Antigamente só padres brancos é que podiam explicar a Bíblia ao povo negro e bem sabemos o que foi essa explicação. Portuga, é como te digo: a Bíblia tem focinho de homem branco...

Corrijo:

- Focinho de opressor, isso sim!

- Portuga: para nós, opressor e branco são sinónimos.

- Crioulo: para nós, em Portugal, opressor é quem oprime, seja branco, seja preto.

Então conto-lhe dos meus amigos em Lisboa. Entre eles, dois negros. Um, o Agostinho Neto, é a sisudez aguerrida; virá a ser o primeiro presidente de Angola. O outro, o Amílcar Cabral, é a alegria militante; não verá a independência da sua Guiné-Bissau, será assassinado antes. O mais subversivo, o mais perigoso, o que mais assusta os opressores é a alegria contestatária, cuidam sempre de visá-la e abatê-la; perguntem ao Samora Machel se estou errado...

Bem sei que estou a atafulhar conhecimentos adquiridos em épocas sucessivas. Explica-se: estava, ou estou, ou estarei a ser laçado por um nó do tempo, ali tudo a acontecer no agora, o que foi, o que é, e o que será.

Ricardo aponta-me um contínuo do Banco do Brasil: é o Zé Pelintra, negro talhado em mogno, fraca figura, apagado, tímido, modesto. No terreiro do candomblé, quando nele baixa Ogum, o seu orixá, transforma-se num tipo dominador e combativo. Interrompo:

- Ogum é São Jorge, não é?

Ricardo irrita-se:

- Nesse jacutá, Ogum é Ogum, não é São Jorge; Iansã é Iansã, não é Santa Bárbara; Xangô é Xangô, não é São Jerónimo; Oxalá é Oxalá, não é Jesus Cristo. Ali não há mixórdia, é tudo autêntico, sem carnaval para turista ver. Não é seita, é religião de oprimido. Entendes, ó Portuga?

Entendo, mas quero ver. Ele hesita. Naquele jacutá só vai preto. E o pessoal ficaria renitente, ou mesmo desconfiado, com a presença de um branco. Não perco a oportunidade para malhar:

- Como é, Ricardo? Vocês agora andam a trabalhar com negativos do racismo?

Decide-se, leva-me. É a noite de 19 de Novembro, disso me lembro. Realmente sou olhado com desconfiança. Alguns até bufam, rosnam, hostilidade. Rufar ritmado de atabaques. Babalorixás e Ialorixás, sacerdotes e sacerdotisas entoam cânticos, alaluê, alaluá, não sei que mais numa língua ou dialecto africano. Zé Pelintra cai em transe, espuma, treme, cai no chão, esperneia. Logo se levanta e realmente mudou de personalidade, os seus olhos até chispam, saravá! baixou Ogum. Sempre a comandar, aconselha e ampara os seus fiéis, alguns dos quais também caiem em transe ao contacto das suas mãos. De repente olha para mim, aponta:

- Ocê num tá creditando, num é?

Abano a cabeça. Insiste:

- Vê prá crê, cumo São Tomé, num é? Vosmecê num qué tomá uma cerveja?

- Vinho, se houver. De preferência tinto.

- Essa é bebida de Xangô, que é seu orixá, tou vendo. Vamo chamá...

Aproxima-se de mim. Impõe as suas mãos sobre a minha testa. Apago-me.

Quando torno a mim, já é dia 20. Fremem os atabaque e o povo canta:

- Zumbi, Zumbi, oia Zumbi! Oia Zumbi mochicongo. Oia Zumbi!


CANAVIAIS

Suplício do tronco - gravura de Debret


Madrugada no terreiro, flores já murchas pelo chão. Ogum retirou-se. Sobrou o Zé Pelintra, fraca figura, outra vez a timidez subiu à tona. Ricardo diz-me que, apesar de branco, Axé, a força viva de Deus, manifestara-se em mim. Xangô, o orixá da Justiça, começara por baixar em mim. Depois, por mim tinham falado a princesa Aqualtune, a seguir os seus filhos Ganga Zumba e Gana Zona e, finalmente, o seu neto Zumbi dos Palmares. Hoje é o dia 20 de Novembro, data em que Zumbi foi executado. Talvez por isso...

Se um orixá me usou para se manifestar no lado de cá, em compensação usei-o eu para ver o lado de lá. Ricardo diz-me que isso não pode acontecer, não é possível, nunca! Abano a cabeça: nunca? Mas tudo, vejo tudo, e como vejo...

Vejo os canaviais de cana doce a ondular em todo o litoral do Nordeste brasileiro. Vejo os navios negreiros a aportar a Recife, zarparam da costa ocidental de África. Branca é sempre a cor do opressor? E os sobas e régulos africanos que venderam outros negros, seus prisioneiros, aos escravocratas brancos? Transportados como gado no porão, vejo que em Pernambuco desembarcam yorubás, angolas, benguelas, congos, cabindas, monjolos, quiloas, minas, rebolos e uns tantos mais, homens, mulheres, até crianças.

Vejo a princesa Aqualtune a ser vendida num leilão de escravos. Vejo que a levam para a casa grande de um senhor de engenho. Dão-lhe um banho e roupa nova, vai aprender a servir à mesa.

Vejo os seus irmãos e o seu povo amontoados na senzala. Vejo que, a chicote, são acordados antes do nascer do sol. Vejo que são empurrados para os canaviais e começam a cortar cana. Há negros promovidos a feitores, também eles usam chicote. Branca é sempre a cor do opressor? Vejo os cativos que juntam e amarram molhes de cana. Vejo que, às costas, os transportam para o engenho. Vejo a moenda, a casa de purgar, as fornalhas, a casa dos cobres, galpões e depósitos, vejo negros que não param de labutar. Trabalho muito, comida pouca, no máximo viverão mais seis ou sete anos.

- Que morram! (diz um senhor). Em África, pretos é o que não falta... O que é preciso é produzir!

Vejo o açúcar disputado pelos mercados da Europa. Vejo um cativo exausto a abrandar o ritmo de trabalho. Um feitor (negro, negro...) trata-lhe as costas a chicote. Um outro dá-lhe palmatoadas nas nádegas. Esfregam com sal as feridas, carne viva. Esse é o castigo para a preguiça, a dor ficará para sempre na memória.

Vejo, a cavalo, um capitão-do-mato (negro, negro...), de carabina a tiracolo, a caçar um escravo fugitivo. Consegue laçá-lo. Se não conseguisse, apontava, fuzilava. Arrasta-o para a senzala. Impõe-lhe uma canga no pescoço e nela as mãos ficam presas. Dá-lhe então o tratamento de chicote e sal. Uma semana depois um capataz, mas branco, retira-lhe a canga, leva-o para o suplício do tronco, no qual os tornozelos ficam presos e, por isso, sentado ou deitado queda-se o preto, e logo leva o segundo tratamento de chicote e sal.

Vejo que, apesar do risco, há escravos que não desistem de fugir. Vejo que, do porto de Recife, rumo a Lisboa, todos os meses largam navios e mais navios com o açúcar produzido por 66 grandes engenhos. A Europa muito aprecia esta doçura luso-tropical.



PALMARES



Em Pernambuco, os escravos fogem. Entretanto, o que está a acontecer no resto do mundo? Consulta a Tábua Cronológica.

Porão de navio negreiro - gravura de Rugendas


Não desistem, apesar do risco... E fogem, como fogem, não param de fugir... Antes a morte do que vida tal. Vejo um grupo de escravos fugitivos a estabelecer-se na serra da Barriga, hoje está no mapa de Alagoas. Isso ocorre, parece-me, por volta de 1600. Vejo que, uns dez anos mais tarde, também a Princesa Aqualtune consegue fugir para a Serra da Barriga. Nó do tempo, remoinhos, remoinhos, e logo vejo que em 1630 a população é já de 3 mil. É quando os holandeses invadem o Nordeste brasileiro. Vejo que a invasão desorganiza a produção açucareira. Vejo que o estado de guerra entre portugueses e holandeses facilita a fuga de um número cada vez maior de escravos. E que em 1670 eles já são 30 mil, república de negros que, por conta própria, correram em busca da liberdade. Ao quilombo dão o nome de Palmares, realmente palmeiras é o que ali não falta. Vejo que o território, a 30 léguas do litoral, é uma faixa com 200 quilómetros de largura, paralela à costa, e que vai desde a margem esquerda do curso inferior do São Francisco até à altura do Cabo de Santo Agostinho. Vejo que abrange o planalto de Garanhuns e, para além da Serra da Barriga, as Serras do Cafuchi, Juçara, Pesqueira e Comonati. Vejo que é banhado por nove rios. Vejo que a floresta e o terreno acidentado tornam difícil a incursão dos soldados brancos. Vejo que a república tem vários mocambos. O principal, o que foi fundado pelo primeiro grupo de escravos foragidos, fica na Serra da Barriga e leva o nome de Cerca do Macaco. Duas ruas espaçosas com umas 1500 choupanas e uns 8 mil habitantes. E Amaro, outro mocambo, tem 5 mil. E há outros, como Sucupira, Tabocas, Zumbi, Osenga, Acotirene, Danbrapanga, Sabalangá, Andalaquituche. Uma rede de 11 mocambos no quilombo de Palmares.

Vejo que a floresta dá quase tudo quanto o povo precisa: frutas, folhas de palma com que fazem as coberturas das choupanas, também as fibras para a confecção de esteiras, vassouras, chapéus, cestos e leques. E ainda a noz de palma de que fazem óleo. Vejo que fazem vestimenta das cascas de algumas árvores. E que produzem manteiga de coco. E que plantam milho, mandioca, legumes, feijão e cana. E que fazem comércio dos seus produtos com pequenas povoações vizinhas, de brancos e mestiços, mas onde não impera a monocultura da cana. Portanto, de escravos não precisam eles. Afinal sempre é possível o relacionamento pacífico entre brancos e pretos, e agora estou a lembrar-me do Amílcar Cabral, e do Agostinho Neto, e do Samora Machel. Não me chateiem, já disse que é um nó do tempo, remoinhos, remoinhos...

Vejo que, em Palmares, as exigências de produção para alimentar milhares de bocas, e a urgência de promover o convívio de tanta gente, leva os palmarinos a organizar o quilombo como se fosse um pequeno Estado. Há leis que passam a regulamentar a vida dos habitantes e algumas são bastantes duras. Roubo, deserção e homicídio são punidos com a morte. Vejo que as decisões mais importantes são tomadas em assembleias nas quais participam todos os adultos. Reparo que a língua franca, naquela babel de tantas línguas e dialectos, é o português ou um crioulo de português. Sei que o mesmo acontecerá no outro lado do Atlântico e até no Índico. Observo que a autoridade é sempre aceite. Não sofrida, nem contestada, pois resulta da vontade colectiva.

Eis-me agora em Olinda, remoinhos. Sei que haver além, naquelas serras, uma Terra da Promissão para os pretos, é o alvoroço permanente dos cativos em Pernambuco, tão perto fica a liberdade... "Há que arrasar Palmares, há que recuperar, vender ou matar os pretos fujões!" - ouço que dizem os senhores de engenho, diz também a tropa portuguesa. E tentam, vejo que tentam, muitas e muitas vezes tentam destruir o quilombo, mas repelidos acabam sempre. Só a Cerca do Macaco é defendida por uma tríplice paliçada, cada qual sob a guarda aturada de 200 homens. A defesa da liberdade é, sem dúvida, a grande organizadora do povo de Palmares.

Primeiro são repelidos os portugueses e depois os holandeses em 1644. Vejo que estes até acabam por desistir de assolar o quilombo. Têm outras guerras mais prementes...

Em 1654 os portugueses expulsam os holandeses do Nordeste brasileiro. Ao fim de 24 anos de guerras e guerrilhas, ficam normalizadas a vida da capitania e a produção açucareira. "Agora o que é preciso é arrasar Palmares!" - ouço os senhores de engenho a reclamar e vejo o Governador a concordar com a exigência.

Mas também vejo que, no ano seguinte, uma das filhas da Princesa Aqualtune pare um menino ao qual é dado o nome de Zumbi, que significa Eis o Espírito! Como sei disto, eu cá não sei...



ZUMBI

Zumbi retorna a Palmares. Entretanto, o que está a acontecer no resto do mundo? Consulta a Tábua Cronológica.


Capitão do mato - gravura de Debret


Vejo que o menino Zumbi corre livremente pelas terras cultivadas do seu mocambo natal, a Cerca do Macaco. Vejo que, aos sete anos, soldados portugueses o apanham desprevenido e o arrastam, com outros negros, para Porto Calvo. Vejo o garoto ser oferecido ao padre António Melo. Vejo que o padre o baptiza com o nome de Francisco. Vejo que lhe ensina português e latim. Aprende rapidamente e começa a ajudar à missa. É considerado rapaz esperto, cativo mui fiel, vigilância abrandada e ele a preparar a retirada. Vejo que, aos quinze anos, finalmente foge da paróquia para Palmares, retorna aos seus.

Vejo que nesse mesmo ano de 1670, Ganga Zumba, filho da Princesa Aqualtune, tio de Zumbi, assume a chefia do quilombo. Vejo que, em 1675, a tropa comandada pelo Sargento-mor Manuel Lopes, depois de batalha sangrenta, ocupa um mocambo com mais de mil choupanas. Vejo que os negros se retiram. Vejo que, cinco meses depois, os negros contra-atacam, combate feroz e Manuel Lopes é obrigado a retirar para Recife.

Condutor dos guerreiros quilombolas é Zumbi, condutor já venerado e tem apenas 20 anos. Do meu caminho arredo almas, procuro-o, digo-lhe:

- És tu o Espártaco negro?

Olha para mim, desconfiado. Nele parece-me reconhecer a sisudez do Agostinho Neto.

- Quem é esse?

- Foi o chefe dos escravos sublevados, na Roma antiga.

- O que lhe aconteceu?

- Lutou até ao fim, foi preso e executado, morreu pregado na cruz.

- Antes esse do que o outro que o padre Melo me queria impingir...

Não me conformo:

- Por que dizes isso? Logo tu, que até aprendestes latim e ajudaste à missa...

Rasga um sorriso que reconheço ser o de Amílcar Cabral. É quanto basta para eu ser apanhado por outro nó do tempo e dou comigo na igreja matriz de Olinda. O pregador famoso do Ricardo, afinal é o próprio padre António Vieira. A dourar a mansidão, sermão ao povo negro:

- Oh se a gente preta tirada das brenhas da sua Etiópia, e passada ao Brasil, conhecera bem quanto deve a Deus, e à sua Santíssima Mãe por este que pode parecer desterro, cativeiro e desgraça, e não é senão milagre, e grande milagre!

António Vieira fala depois no Coré, que quer dizer Calvário. Explica:

- Declara David no título do último salmo quem sejam os operários destas trabalhosas oficinas, e diz que são os filhos de Coré: Pro torcularibus filiis Core. Não há trabalho, nem género de vida no mundo mais parecido à cruz e paixão de Cristo, que o vosso em um destes engenhos.

Remata:

- Bem-aventurados vós se soubéreis conhecer a fortuna do vosso estado, que é um grande milagre da providência e misericórdia divina.

Ouço e vejo tudo, desfaz-se o nó, retorno a Palmares. Quero continuar a conversa mas, sorrindo sempre como o Amílcar, Zumbi acena um adeus, vai-se embora. Tem mais que fazer, os seus guerreiros esperam por ele.



GANGA ZUMBA


Escravo e feitores


Vejo que em 1676 Fernão Carrilho comanda as tropas das vilas apostadas na extinção de Palmares. Ataca o quilombo: insucesso! Regressa a Recife. Mas não desiste. No ano seguinte ataca a Cerca do Macaco. A princesa Aqualtune, o seu filho Ganga Zumba e a maioria dos negros conseguem fugir. Carrilho dirige-se depois para o mocambo de Gana Zona, outro filho de Aqualtune, mas encontra-o em cinzas, incêndio previamente ateado pelos habitantes, terra queimada. Entre as ruínas descubro uma capela com santos da Igreja Católica.

- Mas o que é isto? - pergunto-me.

Zumbi ressurge, sorrindo sempre:

- De África para o Brasil, orixás ou santos, cada qual escolhe os seus, é a única liberdade que os negros têm...

Desaparece.

Carrilho assenta arraiais em Sucupira, pede reforços. Engenha operações-relâmpago, mata muitos pretos, aprisiona outros, entre estes Gana Zona e dois filhos de Ganga Zumba. Pensa já ter destruído Palmares, regressa a Recife, festejos. Porém, passados poucos meses, o quilombo já está reconstruído.

O Governador Pedro de Almeida sabe que é muito difícil a extinção do quilombo. Mais lhe interessa a submissão do que a destruição. Se conseguir fazer a paz, concedendo perdão e alforria aos quilombolas, Palmares poderá vir a ser um novo reduto português, uma nova vila colonial. Manda emissários fazer a proposta a Ganga Zumba, que medita, remói e decide aceitá-la. Muitos chefes negros louvam a prudência e a sabedoria da decisão. Em 1678 Ganga Zumba manda ao Recife três dos seus filhos e mais doze chefes para firmarem a paz. Ganga Zumba é promovido a mestre-de-campo. Para comemorar o acontecimento, vejo que há missa de acção de graças na igreja matriz de Olinda.

Vejo que irrompe Zumbi em desacordo, revoltado contra o tio:

- Enquanto houver um negro cativo, nenhum negro será livre!

Vejo Ganga Zumba a expulsá-lo da Cerca do Macaco.


A JOVEM GUARDA


Zumbi congrega a Jovem Guarda de Palmares. Entretanto, o que está a acontecer no resto do mundo? Consulta a Tábua Cronológica.

Acompanho Zumbi de mocambo em mocambo. Ouço que diz a cada jovem:

- És tu um negro livre? E o teu pai, e os teus irmãos, que sofrem o tratamento de chicote e sal, que sofrem os suplícios da canga e do tronco? E a tua mãe, as tuas irmãs, que são forçadas a abrir as pernas para o senhor de engenho e para os filhos do senhor de engenho? Diz-me: tu és realmente um negro livre?

Em poucos meses está arregimentada a Jovem Guarda do quilombo, guerras e guerrilhas, incêndio de canaviais até às portas de Recife e Porto Calvo. Armas de fogo e munições, só aquelas que os guerreiros negros vão tomando ao inimigo.

Vejo que Pedro de Almeida liberta Gana Zona e manda-o a parlamentar com Zumbi. O tio não consegue dobrar o sobrinho.

Vejo que, na Cerca do Macaco, um jovem põe veneno na comida e assim morre Ganga Zumba. Agora, o incontestado imperador de Palmares, é Zumbi.

Batalhas terríveis. Vejo que o Conselho Ultramarino Português se refere a Zumbi, "tão célebre pelas hostilidades que faz em toda aquela Capitania de Pernambuco, sendo o maior açoite para os povos dela." E ouço que dele diz um dignatário: "Negro de singular valor, grande ânimo e constância rara."

Vejo que, em 1680, Aires de Sousa e Castro é o novo Governador de Pernambuco. Manda apregoar perdão e honrarias ao Capitão Zumbi. O Senhor Governador até já lhe chama capitão... Não morde o isco, segundo Ganga Zumba não é ele, não, não deponho as armas, enquanto houver um negro cativo, nenhum é livre!


DOMINGOS JORGE VELHO

Doningos Jorge Velho - óleo de Benedito Calixto


Vejo que em 1686 há um novo Governador em Pernambuco, o seu nome é Souto Maior, e a guerra contra o Zumbi dos Palmares continua sempre sangrenta.

Vejo que Souto Maior manda chamar Domingos Jorge Velho, bandeirante paulista que, com a sua tropa, gente feroz, andava a prear e a matar os índios do Piauí. Vejo que, a troco de um quinto do valor dos negros recuperados, terras e perdão para os possíveis crimes dos seus homens, o convida para a guerra contra Palmares. O governo entrará com as armas, munições e víveres. Vejo que o acordo entre ambos é assinado em 1691. Vejo mil homens a atacar Palmares e vejo Zumbi e a Jovem Guarda a resistirem na Cerca do Macaco. Vejo Domingos Jorge Velho retirar para Porto Calvo.

Mas também vejo que o Governador manda o Capitão-mor Vieira de Mello ajudar o bandeirante. De 23 a 29 de Janeiro de 1694, duas vezes a tropa tenta romper a Cerca, duas vezes são repelidas. Até mulheres, lá do alto, lançam água a ferver sobre os soldados portugueses. Mas a 6 de Fevereiro, de Recife chegam bombardas. Assestam, disparam, a tiro grosso conseguem rasgar brechas na tripla cerca do mocambo. É por elas que os soldados invadem a cidadela, corpo-a-corpo, massacre, charcos de sangue. Vejo que Zumbi leva dois tiros mas consegue escapar.

- Zumbi não morre, oia Zumbi! não pode morrer, oia Zumbi! tem o corpo fechado, oia Zumbi! - rezam os negros.

Vejo que em 1695, no caminho de Penedo a Recife, é preso um velho quilombola. Prometem-lhe a vida se apontar o esconderijo de Zumbi. E ele aponta. O bandeirante André Furtado de Mendonça é quem comanda o cerco, vence, prende e degola Zumbi dos Palmares. É o dia 20 de Novembro de 1695. O bandeirante leva a cabeça para Recife, repicam os sinos, dia feriado, acção de graças.

- Zumbi, Zumbi, oia Zumbi! Oia Zumbi mochicongo. Oia Zumbi!

Vejo que os negros aprisionados são todos vendidos para capitanias distantes, assim se corta pela raiz a esperança de regeneração do quilombo. As terras de Palmares são divididas em lotes e doadas em sesmarias aos capitães vencedores.

De 1600 a 1695... Durante quase cem anos um espinho cravado na garganta dos escravocratas de Pernambuco... Os tais da casa grande e senzala, os do melaço luso-tropical...


FEITIÇO


Quando torno a mim já é dia 20. Fremem os atabaques e o povo canta:

- Zumbi, Zumbi, oia Zumbi! Oia Zumbi mochicongo. Oia Zumbi!

Cativos do racismo, não me espanta que os filhos de escravos negros invoquem o espírito do Espártaco negro. Atordoado, saio do terreiro.

O Ricardo quer levar-me a casa, de automóvel. Agradeço mas recuso, prefiro ir a pé, estou abafado, talvez a brisa da madrugada me refresque. Alcanço o Largo do Machado e começo a subida. Moro em Santa Teresa, é bairro que me seduz. Lá do alto, gosto muito de ver a cidade a contornar os morros e a esparramar-se pelas praias.

Ouço passos, volto-me, mais abaixo há dois vultos que me seguem. Certamente dois do jacutá, escamados com a presença de um branco. Não me apresso, que venham, logo se vê...

Zumbi traído, Amílcar traído, a traição nunca desarma. E os Ganga Zumbas que há na vida? Cuidar da nossa pele, da nossa pança, os outros que se danem, quem não chegou, chegasse... E os que lutaram pela liberdade e, de oprimidos passaram a opressores? Como aquele negro que lutou na Guiné, lado a lado com o Amílcar? Terá de ser sempre assim, não damos outra volta às nossa vidas?

Chego a casa, não olho para o lado, meto a chave, entro, puxo os lençóis, caio na cama, a ver se durmo...

Na manhã seguinte, à minha porta, está uma galinha preta degolada. Dou-lhe um pontapé, o bicho levanta voo rasante, cai na valeta. Estou de bem comigo, tenho o corpo fechado, feitiço em mim não ferra o dente.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

O Cangaço

Cangaço foi um fenômeno ocorrido no nordeste brasileiro de meados do século XIX ao início do século XX. O cangaço tem suas origens em questões sociais e fundiárias do Nordeste brasileiro, caracterizando-se por ações violentas de grupos ou indivíduos isolados: assaltavam fazendas, sequestravam coronéis (grandes fazendeiros) e saqueavam comboios e armazéns. Não tinham moradia fixa: viviam perambulando pelo sertão, praticando tais crimes, fugindo e se escondendo.
O Cangaço pode ser dividido em três subgrupos: os que prestavam serviços esporádicos para os latifundiários; os "políticos", expressão de poder dos grandes fazendeiros; e os cangaceiros independentes, com características de banditismo.

Os cangaceiros conheciam a caatinga e o território nordestino muito bem, e por isso, era tão difícil serem capturados pelas autoridades. Estavam sempre preparados para enfrentar todo o tipo de situação. Conheciam as plantas medicinais, as fontes de água, locais com alimento, rotas de fuga e lugares de difícil acesso.

O primeiro bando de cangaceiros que se tem conhecimento foi o de Jesuíno Alves de Melo Calado, "Jesuíno Brilhante", que agiu por volta de 1870. E o último foi de "Corisco" (Cristino Gomes da Silva Cleto), que foi assassinado em 25 de maio de 1940.

O cangaceiro mais famoso foi Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, também denominado o "Senhor do Sertão" e "O Rei do Cangaço". Atuou durante as décadas de 20 e 30 em praticamente todos os estados do nordeste brasileiro.

Por parte das autoridades, Lampião simbolizava a brutalidade, o mal, uma doença que precisava ser cortada. Para uma parte da população do sertão, ele encarnou valores como a bravura, o heroísmo e o senso da honra.

O cangaço teve o seu fim a partir da decisão do então Presidente da República, Getúlio Vargas, de eliminar todo e qualquer foco de desordem sobre o território nacional. O regime denominado Estado Novo incluiu Lampião e seus cangaceiros na categoria de extremistas. A sentença passou a ser matar todos os cangaceiros que não se rendessem.

No dia 28 de julho de 1938, na localidade de Angicos, no estado de Sergipe, Lampião finalmente foi apanhado em uma emboscada das autoridades, onde foi morto junto com sua mulher, Maria Bonita, e mais nove cangaceiros.

Esta data veio a marcar o final do cangaço, pois, a partir da repercussão da morte de Lampião, os chefes dos outros bandos existentes no nordeste brasileiro vieram a se entregar às autoridades policiais para não serem mortos.

Consta que o primeiro homem a agir como cangaceiro teria sido o Cabeleira, como era chamado José Gomes. Nascido em 1751, em Glória do Goitá, cidade da zona da mata pernambucana, ele aterrorizou sua região, incluindo Recife. Mas foi somente no final do século XIX que o cangaço ganhou força e prestígio, principalmente com Antônio Silvino, Lampião e Corisco.

Entre meados do século XIX e início do século XX, o nordeste do Brasil viveu momentos difíceis, atemorizado por grupos de homens que espalhavam o terror por onde andavam. Eles eram os cangaceiros, bandidos que abraçaram a vida nômade e irregular de malfeitores por motivos diversos. Alguns deles foram impelidos pelo despotismo de homens poderosos.

Um famoso cangaceiro foi Lampião. Os cangaceiros conseguiram dominar o sertão durante muito tempo, porque eram protegidos de coronéis, que se utilizavam dos cangaceiros para cobrança de dívidas, entre outros serviços "sujos".

Um caso particular foi o de Januário Garcia Leal, o Sete Orelhas, que agiu no sudeste do Brasil, no início do século XIX, tendo sido considerado justiceiro e honrado por uns e cangaceiro por outros.

No sertão, consolidou-se uma forma de relação entre os grandes proprietários e seus vaqueiros.
A base desta relação era a fidelidade dos vaqueiros aos fazendeiros. O vaqueiro se disponibilizava a defender (de armas na mão) os interesses do patrão.

Como as rivalidades políticas eram grandes, havia muitos conflitos entre as poderosas famílias. E estas famílias se cercavam de jagunços com o intuito de se defender, formando assim verdadeiros exércitos. Porém, chegou o momento em que começaram a surgir os primeiros bandos armados, livres do controle dos fazendeiros.

Os coronéis não tinham poder suficiente para impedir a ação dos cangaceiros.
De todos eles, o mais famoso foi Lampião (Virgulino Ferreira da Silva). Seu bando agiu entre os anos de 1920 e 1938. Após sua morte, nenhum outro bando ocupou o seu lugar e com o fim de República Velha encerrava-se também a era do cangaço

Virgulino Lampião o maior dos Cangaceiros

Virgulino nasceu em 7 de junho de 1898 na cidade de Vila Bela, atual Serra Talhada, no semi-árido do estado de Pernambuco e foi o terceiro filho de José Ferreira da Silva e Maria Lopes. O seu nascimento, porém, só foi registrado no dia 7 de agosto de 1900. Até os 21 anos de idade ele trabalhava como artesão, era alfabetizado e usava óculos para leitura, características bastante incomuns para a região agreste e pobre onde ele morava.

Sua família travava uma disputa mortal com outras famílias locais até que seu pai foi morto em confronto com a polícia em 1919. Virgulino jurou vingança e, ao fazêlo, provou ser um homem extremamente violento. Ele se tornou um criminoso e foi incessantemente perseguido pela polícia, a quem ele chamava de macacos.

Durante os 19 anos seguintes, ele viajou com seu bando de cangaceiros, nunca mais de 50 homens, todos com cavalos e fortemente armados usando roupas de couro como chapéus, sandálias, casacos, cintos de munição e calças para protegê-los dos arbustos com espinhos típicos da caatinga. Suas armas eram, em sua maioria, roubadas da polícia e unidades paramilitares como a espingarda Mauser militar e uma grande variedade de armas pequenas como rifles Winchester, revolveres e pistolas Mauser semi-automáticas.

Lampião foi acusado de atacar pequenas fazendas e cidades em sete estados além de roubo de gado, sequestros, assassinatos, torturas, mutilações, estupros e saques.

Sua namorada, Maria Gomes de Oliveira - conhecida como Maria Bonita, juntou-se ao bando em 1930 e, assim como as demais mulheres do grupo, vestiam-se como cangaceiros e participou de muitas das ações do bando. Virgulino e Maria bonita tiveram uma filha, Expedita Ferreira, nascida em 13 de setembro de 1932. Há ainda a informação controversa de que eles tiveram mais dois filhos: os gêmeos Ananias e Arlindo Gomes de Oliveira[3], além de outros dois natimortos.

A morte de Lampião e seu bando

No dia 27 de julho de 1938, o bando acampou na fazenda Angicos, situada no sertão de Sergipe, esconderijo tido por Lampião como o de maior segurança. Era noite, chovia muito e todos dormiam em suas barracas. A volante chegou tão de mansinho que nem os cães pressentiram. Por volta das 5:15 do dia 28, os cangaceiros levantaram para rezar o oficio e se preparavam para tomar café; quando um cangaceiro deu o alarme, já era tarde demais.

Não se sabe ao certo quem os traiu. Entretanto, naquele lugar mais seguro, segundo a opinião de Virgulino, o bando foi pego totalmente desprevenido. Quando os policiais do Tenente João Bezerra e do Sargento Aniceto Rodrigues da Silva abriram fogo com metralhadoras portáteis, os cangaceiros não puderam empreender qualquer tentativa viável de defesa.

O ataque durou uns vinte minutos e poucos conseguiram escapar ao cerco e à morte. Dos trinta e quatro cangaceiros presentes, onze morreram ali mesmo. Lampião foi um dos primeiros a morrer. Logo em seguida, Maria Bonita foi gravemente ferida. Alguns cangaceiros, transtornados pela morte inesperada do seu líder, conseguiram escapar. Bastante eufóricos com a vitória, os policiais apreenderam os bens e mutilaram os mortos. Apreenderam todo o dinheiro, o ouro e as jóias.

A força volante, de maneira bastante desumana para os dias de hoje, mas seguindo o costume da época, decepou a cabeça de Lampião. Maria Bonita ainda estava viva, apesar de bastante ferida, quando foi degolada. O mesmo ocorreu com Quinta-Feira, Mergulhão (os dois também tiveram suas cabeças arrancadas em vida), Luis Pedro, Elétrico, Enedina, Moeda, Alecrim, Colchete (2) e Macela. Um dos policiais, demonstrando ódio a Lampião, desfere um golpe de coronha de fuzil na sua cabeça, deformando-a; este detalhe contribuiu para difundir a lenda de que Lampião não havia sido morto, e escapara da emboscada, tal foi a modificação causada na fisionomia do cangaceiro.

Feito isso, salgaram as cabeças e as colocaram em latas de querosene, contendo aguardente e cal. Os corpos mutilados e ensangüentados foram deixados a céu aberto, atraindo urubus. Para evitar a disseminação de doenças, dias depois foi colocada creolina sobre os corpos. Como alguns urubus morreram intoxicados por creolina, este fato ajudou a difundir a crença de que eles haviam sido envenenados antes do ataque, com alimentos entregues pelo coiteiro traidor.

Percorrendo os estados nordestinos, o coronel João Bezerra exibia as cabeças - já em adiantado estado de decomposição - por onde passava, atraindo uma multidão de pessoas. Primeiro, os troféus estiveram em Piranhas, onde foram arrumadas cuidadosamente na escadaria da igreja, junto com armas e apetrechos dos cangaceiros, e fotografadas. Depois, foram levadas a Maceió e ao sul do Brasil.

No IML de Maceió, as cabeças foram medidas, pesadas, examinadas, pois os criminalistas achavam que um homem bom não viraria um cangaceiro: este deveria ter características sui generis. Ao contrário do que pensavam alguns, as cabeças não apresentaram qualquer sinal de degenerescência física, anomalias ou displasias, tendo sido classificados, pura e simplesmente, como normais.

Do sul do País, apesar do péssimo estado de conservação, as cabeças seguiram para Salvador, onde permaneceram por seis anos na Faculdade de Odontologia da UFBA. Lá, tornaram a ser medidas, pesadas e estudadas, na tentativa de se descobrir alguma patologia. Posteriormente, os restos mortais ficaram expostos no Museu Nina Rodrigues, em Salvador, por mais de três décadas.

Durante muito tempo, as famílias de Lampião, Corisco e Maria Bonita lutaram para dar um enterro digno a seus parentes. O economista Silvio Bulhões, filho de Corisco e Dadá, em especial, empreendeu muitos esforços para dar um sepultamento aos restos mortais dos cangaceiros e parar, de vez por todas, a macabra exibição pública. Segundo o depoimento do economista, dez dias após o enterro de seu pai, a sepultura foi violada, o corpo foi exumado, e sua cabeça e braço esquerdo foram cortados e colocados em exposição no Museu Nina Rodrigues.

O enterro dos restos mortais dos cangaceiros só ocorreu depois do projeto de lei no. 2867, de 24 de maio de 1965. Tal projeto teve origem nos meios universitários de Brasília (em particular, nas conferências do poeta Euclides Formiga), e as pressões do povo brasileiro e do clero o reforçaram. As cabeças de Lampião e Maria Bonita foram sepultadas no dia 6 de fevereiro de 1969. Os demais integrantes do bando tiveram seu enterro uma semana depois

Índia Morena (circense) - Patrimônio Vivo de Pernambuco


Margarida Pereira de Alcântara, a Índia Morena, é considerada a maior contorcionista pernambucana de todos os tempos. Com 65 anos, 55 dedicados à vida circense, a artista nasceu no Recife, em 13 de julho de 1943. Sua carreira nos picadeiros começou quando era ainda muito jovem, aos 10 anos de idade. Na época, morava com os cinco irmãos e a mãe no bairro de Afogados, na Vila São Miguel, e ajudava no sustento da casa catando crustáceos nos mangues do Recife.

Ainda hoje Índia Morena se lembra do primeiro dia em que pisou em um palco, em 1952, quando ganhou um concurso de calouros promovido pelo Circo Democratas, na época montado na Vila São Miguel. \"Foi nesse dia que vi meu mundo\", cometa a artista.

A partir daí, apaixonou-se pela arte circense e no dia 1º de julho de 1953 deixou sua casa, contra a vontade da mãe, para seguir a carreira no Circo Itaquatiara. E mais de cinco décadas sob as lonas, passou pelo trapézio voador, pela escada giratória, arame vertical, mas foi com o contorcionismo que fez história. Em sua carreira profissional, a artista integrou mais de 50 circos, destaque para Bartolo, Garcia, e o argentino New American Circus. Índia Morena ainda se apresentou várias vezes no exterior, em países como Argentina, Paraguai, Uruguai e Bolívia.

Atualmente, Índia Morena lidera a trupe do Gran Londres Circo, composta por mais de 20 integrantes, entre palhaços, malabaristas e pernas-de-pau. Apesar de não se apresentar mais como contorcionista, não se afastou dos picadeiros, fazendo vez de mestre de cerimônias, apresentando espetáculos, ajudando palhaços e propagando a importância da arte circense.

Atualmente a artista é um dos Patrimônios Vivos do Estado, por sua contribuição ao circo pernambucano.

Contato: (81) 8640-8206
(81) 8640-8206

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Cobra Cordelista realiza o Show Salas de Cordel na Biblioteca do SESC em Piedade-Jaboatão dos Guararapes

Meus parabéns a Ana Rosa responsável pela biblioteca do SESC, pelo carinho dedicado as crianças, a organização do Evento, a estrutura providenciada e, acima de tudo a participação responsável para o sucesso do Evento.



Para realizar um evento como este, é importante a participação dos gestores públicos e educadores, pois os jovens muitas vezes não estão habituados com esta relação direta com o autor, seja ele escritor, jornalista, poeta, ou qualquer outro profissional que realize palestras e shows culturais, cujo conteúdo da mensagem necessite de maior atenção, ou interação por parte do público. Para ser mais claro, em algumas escolas onde visitei alguns gestores não entendem a mensagem, e encararam como aula vaga, o momento em que os meninos estão com o artista, e vão para a sala dos professores corrigir provas, ou mesmo relaxar. E aí aquilo que poderia ser bem proveitoso, torna-se desgastante. Este é um momento de educar, ensinar a criança, ou ao jovem, como se comportar em um teatro, em um cinema, em uma palestra etc. Ou seja, a escola precisa educar para a vida, a vida em sociedade e nisto no SESC foi nota dez. Espero voltar lá em outro momento, aguardo convite, e gostaria que em outras escolas onde já realizei o Salas de Cordel, todos os Gestores tivessem a mesma sensibilidade e responsabilidade.

Abraços de Cobra Cordelista.

Vejam as fotos:




terça-feira, 10 de agosto de 2010

Louro do Pajeú



Em outubro de 1966, o então governador de Pernambuco, Paulo Guerra, assiste na residência do deputado Walfredo Siqueira, em São José do Egito, a uma apresentação dos violeiros-repentistas Louro do Pajeú e Ivanildo Vilanova. A foto é do arquivo particular da família Siqueira. Um dos grandes repentistas do Nordeste, Lourival Batista Patriota nasceu em 6/1/1915, na Vila Umburanas, hoje município de Itapetim – PE (antes pertencia a São José do Egito - PE) e faleceu em Recife – PE, em 8/12/1992.

"Versos do "Louro do Pajeú"

Meus filhos são passarinhos
que vivem dos meus gorjeios;
eu, para encher os seus papos,
caço grãos em chãos alheios
e só boto um grão no meu
quando vejo os deles cheios...

Meu DEUS que sorte mesquinha
desse cego e dessa cega,
chegaram aqui na bodega,
se meteram na branquinha,
DIOGO puxa CHIQUINHA,
CHIQUINHA puxa DIOGO,
ficaram assim nesse jogo,
o carro já está no prego.
A cega puxando o cego
e o cego puxando fogo.

Pra cantar um desafio
a ninguém peço socorro;...
vai chegando ORLANDO TEJO,
que é da altura dum morro,
TEJO que anda esta hora
não tem medo de cachorro.

Entre o gosto e o desgosto,
o quadro é bem diferente,
ser moço é ser um sol nascente,
ser velho é ser um sol posto,
pelas rugas do meu rosto,
o que fui hoje não sou,
ontem estive, hoje não estou,
que o sol ao nascer fulgura,
mas ao se pôr deixa escura
a parte que iluminou.

Um sábio muito profundo
me perguntou certa vez:
você já conhece os três
desmantelos deste mundo?
Eu respondi num segundo
DOIDO, MULHER e LADRÃO,
dei mais a explicação
DOIDO não tem paciência,
LADRÃO não tem consciência,
MULHER não tem coração.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Passando o repertório

Era apenas para agente afinar o novo repertório, nos juntamos no primeiro andar do Bar Sem Nome. Zeca chegou com a sua amada Patrícia pra lá de legal e bonitona, afinal os pombinhos estão de namoro recente. Boa sorte e que Deus ilumine seus caminhos. Luiza, de Preto soltou a voz, e com as duas formaram um trio harmonioso, e cantaram "lembrança de um Beijo". Na percussão meu amigo Pereira, e no Violão Messias, que também soltou o gogó pra cima, e arrancou aplausos da platéia. Depois tem mais gente, a próxima aqui em Jaboatão, é no dia 30 de setembro, no Tendas Bar, e começa as 16:00h, sem hora pra terminar , pois é aniversário deste cordelista e com certeza vários artistas vão passar por lá e dá uma canjinha, vai ser de arrombar a boca do balão. E tem mais, nosso blog vai comemorar os dez mil acessos conseguidos este ano até agora, divulgando a cultura nordestina.

Indique nosso blog pra seus amigos e não perca a festa!



terça-feira, 20 de julho de 2010

SHOW DE COBRA CORDELISTA NO PAJEU DAS FLORES


Dia 13 de Agosto de 2010, as 21:00hs em MARCELLOS BAR na cidade de São José do Egito tem Show de Cobra Cordelista. No Repertório Contos, Causos, Forró de Raiz e a poesia matuta com muito Lirismo e bom humor. Não faltar a musica romântica para embalar a noite dos casais enamorados.


MARCELLOS BAR
RUA PADRE GUEREL13
IPIRANGA – SÃO JOSE DO EGITO- PERNAMBUCO
FONE (87) 9605.4427